Processo nº. 381-08.
2016.6.13.0218
Requerentes:
"Coligação Pirapora Volta a Sorrir (PP, PDT, PSL, DEM, PRTB, PV, PROS PT
do B, PC do B, PSD, PRP, PPL, PSB)"
- Warmillon Fonseca Braga.
Natureza: - Registro de
Candidatura
SENTENÇA
I – HISTÓRICO
Trata-se de pedido de registro de candidatura de WARMILLON FONSECA BRAGA
ao cargo de Prefeito, com o número 25, pela "COLIGAÇÃO PIRAPORA VOLTA A
SORRIR", no município de Pirapora.
Publicado o edital para ciência dos interessados, sobrevieram duas
impugnações, a primeira, pelo Ministério Público Eleitoral (ff. 201/211),
instruída com documentos (ff. 212/296) e a segunda, pela COLIGAÇÃO "MÃOS
LIMPAS", constituída pelos Partidos Políticos PMDB, PSC, PRB, PT, PTB,
REDE, PTN, PR,PPS, PSDC, PHS, PMN, PTC, PSB, PSDB, PEN e SD, também acompanhada
por documentos (ff. 307/389).
O Ministério Público Eleitoral aduziu, em síntese, que o
requerente/impugnado incide nas inelegibilidades previstas na Lei Complementar
nº. 64/90 (Lei da Ficha Limpa), porquanto condenado por Órgão Judicial
colegiado pela prática de atos dolosos de improbidade administrativa,
tipificados no art. 10, I, IX, e XI, da Lei nº. 8.429/1992, bem como condenado
criminalmente pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, como incurso nas
sanções do art. 1ª, inciso I, do Decreto-Lei nº. 201/67 e art. 89, caput, da
Lei nº. 8.666/93, razões pelas quais deve ser indeferido o pedido de registro
da candidatura.
A COLIGAÇÃO "MÃOS LIMPAS", por seu turno, suscitou as mesmas
questões fáticas e jurídicas esposadas pelo parquet.
Regularmente notificado (f. 390), o impugnado ofertou resposta (ff.
393/399) instruída por documentos (ff. 400/415). Alegou, em resumo, que não
existe inelegibilidade decorrente do julgamento da Apelação Cível nº.
2009.38.07.0001413-5/MG, uma vez que o processo encontra-se suspenso por
determinação do STF, com repercussão geral reconhecida, conforme comprovado
pela certidão anexa. Acrescenta, ademais, que da leitura do acórdão não se
verificam os pressupostos da inelegibilidade, uma vez que não há menção quanto
à existência de dolo, lesão ao patrimônio público e enriquecimento ilícito.
Asseverou, ainda, que não merece prosperar igualmente a inelegibilidade
decorrente de condenação criminal, por violação ao princípio constitucional da
presunção da inocência, a despeito do posicionamento herege do STF, que
reconheceu a constitucionalidade da lei. Contudo, o TJMG, órgão prolator do
acórdão condenatório, decidiu conferir efeito suspensivo e devolutivo à
decisão, impedindo que a condenação produza seus efeitos primários e
secundários, dentre eles a inelegibilidade, razão pela qual deve ser deferido
ao requerente o seu pedido de registro de candidatura.
É o relatório no necessário.
DECIDO.
II - FUNDAMENTAÇÃO
Nos termos do art. 355, I, do NCPC, procedo ao julgamento antecipado da
lide, posto que, embora a questão de mérito versada no presente feito seja de
direito e de fato, não há necessidade de produção de provas em audiência.
Analisando os argumentos suscitados pelo Requerente/Impugnado e pelos
Impugnantes, bem como as provas documentais acostadas aos autos, verifico que
se afigura incontroverso que Warmillon Fonseca Braga tem em seu desfavor dois
acórdãos condenatórios prolatados por órgãos colegiados do Poder Judiciário, um
por improbidade administrativa e outro de natureza criminal.
Nesse sentido, destaco a cópia do acórdão emanado do Tribunal Regional
Federal da 1ª Região (ff. 222/232) e a cópia do acórdão oriundo do Tribunal de
Justiça de Minas Gerais (ff. 238/289).
Assim,
cumpre-me analisar os efeitos de ambas às condenações no âmbito dos direitos
políticos do Requerente/Impugnado, bem como os argumentos veiculados por sua
ilustre defesa.
I - Da Condenação por Ato
de Improbidade Administrativa
Segundo argumentado pelo Impugnado, nem toda condenação por improbidade
administrativa se revela capaz de atrair a inelegibilidade prevista na LC
64/90, com redação dada pela Lei da Ficha Limpa (LC 135/10) e que, no caso
concreto, não se encontram configurados os pressupostos para a sua incidência,
porquanto não se vislumbra do acórdão proveniente do TRF que Warmillon tenha
agido com dolo, tenha causado lesão ao patrimônio público ou mesmo auferido
enriquecimento ilícito.
De fato, a jurisprudência do Colendo Tribunal Superior Eleitoral
consolidou o entendimento de que, para a incidência da inelegibilidade prevista
no art. 1º, inciso I, alínea "L", da LC 64/90, se afigura necessária
que a condenação por improbidade administrativa tenha reconhecido a presença do
dolo na conduta, o prejuízo ao erário e o enriquecimento ilícito, próprio ou de
terceiros:
ELEIÇÕES 2012. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO NOS PRÓPRIOS AUTOS. REGISTRO DE
CANDIDATURA INDEFERIDO. VEREADOR. ART. 1º, I, L, DA LC Nº 64/90. CONDENAÇÃO POR
ATO DOLOSO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. REQUISITOS. PREENCHIMENTO.
INELEGIBILIDADE. INCIDÊNCIA. DESPROVIMENTO. 1. No caso vertente, o agravante
foi condenado - mediante decisão colegiada, em ação de improbidade - à
suspensão dos direitos políticos, em decorrência de dano causado ao Erário, bem
como por enriquecimento ilícito próprio e de terceiro, por ter, junto aos
demais vereadores, firmado contratos individuais de locação de automóveis a
preços superfaturados. 2. O dolo também restou demonstrado, haja vista a
impossibilidade de se vislumbrar a prática da referida conduta sem que seja
dolosa, consoante delineou o acórdão recorrido. 3. O entendimento em tela está
em harmonia com a jurisprudência mais recente desta Corte, segundo a qual a
inelegibilidade do art. 1º, I, L, da LC nº 64/90 incide quando verificada, efetivamente,
a condenação cumulativa por dano ao Erário e enriquecimento ilícito, em
proveito próprio ou de terceiro, ainda que a condenação cumulativa não conste
expressamente da parte dispositiva da decisão condenatória (Precedentes: RO nº
1408-04/RJ, Relatora Ministra Maria Thereza, PSESS de 22.10.2014; RO nº
380-23/MT, Rel. Min. João Otávio de Noronha, PSESS de 11.9.2014). 4. Agravo
regimental desprovido. (TSE - AgR-AI: 189769 CE, Relator: Min. LUCIANA
CHRISTINA GUIMARÃES LÓSSIO, Data de Julgamento: 22/09/2015, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça
eletrônico, Tomo 200, Data 21/10/2015, Página 27/28)
No entanto, com redobradas vênias ao culto e aguerrido advogado do
Impugnado, verifico do acórdão o reconhecimento de que Warmillon agiu
impulsionado pela consciência e pela vontade, ou seja, com dolo, conforme
trecho que se segue (f. 232): "(...) No tocante à configuração do dolo,
tenho que restou devidamente comprovado, considerando que o próprio apelante
tinha conhecimento da ausência dos tanques sépticos necessários para o
funcionamento das unidades sanitárias, tendo mesmo assim prestado contas do
convênio, informando falsamente que o objeto do contrato teria sido
regularmente cumprido da forma como previsto no plano de trabalho" (destaque
nosso).
O dano ao patrimônio público restou patentemente reconhecido pela
instância superior da Justiça Federal, conforme verberado pela Desembargadora
Relatora (f. 230): "(...) os documentos acostados pelo Ministério Público
Federal, apensados à presente ação, são suficientes para confirmar a prática de
atos de improbidade por parte do apelante, que na qualidade de Prefeito de
Lagoa dos Patos/MG, deixou de cumprir o convênio 740/98 firmado com a FUNASA,
acarretando prejuízo ao erário"
(destaque nosso).
Verifico, por derradeiro, que também se faz presente o último requisito,
qual seja, o enriquecimento ilícito, que na hipótese fática favoreceu
terceiros, conforme se infere de trechos do acórdão (f. 232): "(...)
Observa-se, portanto, que com a contratação de empresa inidônea para a execução
do objeto contratado pelo apelante, na condição de prefeito do município de
Lagoa dos Patos/MG, foi aplicada verba pública de forma irregular, tendo dado
causa ao enriquecimento indevido da Empresa Minas Construção, saneamento Básico
e Serviço Ltda." (destaque nosso).
Nesse contexto, observando-se que: a) a decisão foi proferida por órgão
colegiado do Poder Judiciário; b) que a condenação por improbidade
administrativa se deu na modalidade dolosa; c) que a conduta ímproba acarretou
dano ao erário e causou enriquecimento ilícito; d) que restou declarada a
suspensão dos direitos políticos; e) que o prazo de inelegibilidade não se
encontra exaurido, inevitável a incidência da causa de inelegibilidade prevista
na LC 64/90, com redação dada pela Lei da Ficha Limpa (LC 135/10).
Acrescente-se que, a despeito da suspensão da tramitação do processo por
determinação do STF, em virtude do debate de matéria análoga com repercussão
geral, tal circunstância não impede o reconhecimento da inelegibilidade, uma
vez que a lei complementar que disciplina a questão exige apenas a condenação
emanada de Órgão Colegiado do Poder Judiciário, sendo prescindível o trânsito
em julgado.
II - Da condenação Criminal
O Impugnado sustenta ainda, que a condenação criminal não tem o condão
de impedir o deferimento do registro de sua candidatura, porquanto o art. 26-A
e o art. 26-c da LC nº. 135/10 possibilitou a suspensão da inelegibilidade pelo
órgão competente ou pelo órgão colegiado superior que possuir competência
recursal, sendo que, no caso concreto, o próprio TJMG firmou posição que
evidencia a suspensão da inelegibilidade (f. 279):
"Deixo de determinar o imediato cumprimento da pena antes do
trânsito em julgado por entender que a garantia fundamental insculpida no art.
5º, inc. LVII, da Constituição Federal não comporta exceção".
"Conforme bem pontuou o Ministro Marco Aurélio, na ocasião do
julgamento do HC/SP-126.292/15, cujo acórdão ainda não foi publicado e pode
sofrer modificações em virtude de eventual recurso, o efeito suspensivo para os
recursos extraordinários (ao Superior Tribunal de Justiça ou ao Supremo
Tribunal Federal) decorre do taxativo dispositivo constitucional".
"Por isso, a prisão penal ou a determinação de cumprimento precoce
da pena antes do trânsito em julgado, em razão da garantia individual pétrea da
presunção de inocência, só é possível nos casos de prisão cautelar".
No entanto, com a devida vênia, vislumbro um desvio de perspectiva do
impugnado.
Conforme divulgado amplamente na grande mídia, em fevereiro do ano em
curso, o plenário do STF decidiu, por 7 votos a 4, alterar a jurisprudência
adotada no País para permitir a execução da pena a partir das condenações por
Tribunal de 2ª instância, considerando prescindível o trânsito em julgado da
decisão.
A mudança de entendimento do Pretório Excelso havia sido defendida pelo
juiz federal Sergio Moro, que atua nos processos da Operação Lava Jato, e
chegou a ser classificada como "essencial para garantir maior efetividade
do processo penal e proteção dos direitos da vítima e da sociedade, sem afetar
significativamente os direitos do acusado".
Em sentido diametralmente oposto, a OAB, capitaneada por renomados
advogados criminalistas, defendeu que a mudança de entendimento fere de morte o
princípio constitucional da presunção de inocência, inserido como garantia
fundamental do cidadão na Constituição da República.
Na semana retrasada, causou polêmica a decisão do ministro do STF Luiz
Edson Fachin que revogou uma decisão do presidente daquele Tribunal, Ricardo
Lewandowski, que contrariava entendimento da maioria dos ministros, sobre o
início do cumprimento da pena após decisão de tribunal em 2ª instância. Na
ocasião, Fachin lembrou que a Corte se manifestou de forma colegiada sobre o
tema.
Toda a celeuma ainda existente sobre a questão, decorre da ausência de
força vinculante do posicionamento adotado pela maioria dos ministros do STF, o
que permite aos demais órgãos do Poder Judiciário se posicionar de maneira
diversa.
No caso em tela, contudo, o eminente relator, seguido pelos seus pares,
consignou expressamente: “Deixo de determinar o imediato cumprimento da pena
antes do trânsito em julgado por entender que a garantia fundamental insculpida
no art. 5º, inc. LVII, da Constituição Federal não comporta exceção".
Assim, apenas o imediato cumprimento da pena criminal restou sobrestado,
não os demais efeitos primários e secundários decorrente da condenação.
Registre-se que, conforme admitido pelo impugnado em sua resposta, o STF
concluiu a análise conjunta das Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADC
nº.29 e nº.30) e da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI nº.4578) que
tratam da Lei Complementar 135/2010, a Lei da Ficha Limpa, prevalecendo o
entendimento em favor da constitucionalidade da lei.
Logo, restando incontroverso nos autos que Warmillon foi condenado, em
decisão proferida por órgão judicial colegiado, em razão da prática de crime
contra a administração pública, inevitável a incidência da causa de
inelegibilidade prevista na LC nº. 64/90, com redação dada pela Lei da Ficha
Limpa (LC nº.135/10).
III – DISPOSITIVO
Em face do exposto, acolho a impugnação do Ministério Público Eleitoral
e da Coligação “MÃOS LIMPAS" para indeferir o pedido de registro de candidatura de WARMILLON FONSECA
BRAGA, pela "COLIGAÇÃO PIRAPORA VOLTA A SORRIR", para concorrer ao
cargo de Prefeito, com o número 25, no município de Pirapora, com fundamento no art. 1º, inciso I, alínea "e" (condenação criminal) e alínea 'l'
(condenação por ato de improbidade) da Lei Complementar nº. 64/90, com redação
dada pela Lei Complementar nº135/2010 (Lei da Ficha Limpa).
Publique-se. Registre-se.
Intime-se.
Em havendo recurso, verificada a tempestividade, aguarde-se o prazo para
apresentação das razões e contra-razões recursais, devendo-se, com ou sem elas,
remeter os autos ao Egrégio Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais.
Pirapora, 26 de agosto de 2016.
Nalbernard de Oliveira
Bichara
Juiz Eleitoral